Viana Visão
Reflexões de um grupo de viajantes principiantes no
país asiático sobre as peculiaridades, raridades e curiosidades de um destino
turístico que não parece deste mundo. Faz um mês que estou viajando pelo Japão para fazer
uma série de reportagens e acompanhar dois grupos do El Pais Viajes. Não é
a primeira vez que venho guiando viajantes em sua primeira visita a este país
asiático e sempre adoro ver suas reações e gestos quando descobrem as
peculiaridades de uma nação inclassificável. Eu me atreveria a dizer que é
única no mundo. Tanto que possivelmente não seja deste, mas do espaço exterior.
Perguntei a alguns desses viajantes o que lhes causou a maior surpresa entre as
singularidades japonesas. Estas são algumas delas: 1. Um país sem lixeiras, nem lixo no chão. No Japão, as crianças são educadas desde
pequenas para não jogar o lixo na lixeira e a levá-lo para casa. É por isso que
quase não há latas de lixo em espaços públicos. Se você tem um papel, uma
embalagem ou uma ponta de cigarro leva no bolso até chegar em casa. E
ainda assim, não se vê nada jogado nas calçadas. Um grupo de marcianos.
2. Você deixa a bicicleta na rua e no dia seguinte
ela está no mesmo lugar!
O índice de furtos na rua é ínfimo. Em cidades
superpopulosas como Tóquio as bicicletas são deixadas nas calçadas,
na porta do prédio, com um simples bloqueador de roda nem mesmo presas com um
cadeado a um poste ou uma cerca. E na manhã seguinte, lá continuam. É verdade
que é proibido deixá-las em qualquer lugar. Têm de ser guardadas em
estacionamentos próprios para bicicletas, que são pagos. Bicicleta estacionada na rua sem grandes medidas de
segurança. 3 Não se fuma na rua, mas é permitido nos
restaurantes. É proibido fumar na rua enquanto se
caminha porque você pode incomodar ou queimar outro transeunte. Você só pode
fumar em áreas demarcadas e sinalizadas da via pública, onde há cinzeiros. No
entanto, você pode fumar em restaurantes, se assim o proprietário definir. Ou
seja, há restaurantes livres de fumo, outros com área para fumantes e – menos –
os com 100% de direito a fumar. 4 Um país sem gorjetas. Não se dá gorjeta para nenhum serviço, e isso é até
malvisto. Se alguém deixar cinco ienes do troco na mesa, o garçom persegue a
pessoa até a porta para lhe dizer que esqueceu uma coisa. 5 Não há carros estacionados na rua. No Japão, é proibido estacionar em espaços
públicos. Se você tem um carro ou tem garagem própria ou o leva a um
estacionamento público que custa uma nota. A multa é de 18.000 ienes 650
reais e você não verá à noite nenhuma cidade com ruas lotadas de carros bem ou
mal estacionados. 6 No trem não se fala no celular. O Shinkansen é o sistema nacional de trens-bala que
une todo o país em velocidades só comparáveis apenas a sua eficiência e
pontualidade. A bordo é proibido falar no celular para não atrapalhar
outros viajantes. Mas o mais incrível é que todos obedecem. Como no trem de
alta velocidade na Espanha. 7 Cachorros- bebê. Para um amante de animais de estimação, o cão
ou gato se torna um membro da família. Mas a relação cachorro-dono no Japão
rompe todos os limites. Não sei se é pela complicação em ter e criar uma
criança o Japão é um dos países com menor taxa de natalidade e um terrível
problema de envelhecimento da população ou por qual estranha razão, mas a
verdade é que há uma multidão de casais, muitos deles jovens, tratando seus
cães como se fosse bebê, incluindo levá-los em cestos ou carrinhos de bebê. 8 Prevenir, melhor que curar. Nos genes japoneses está escrito que a prevenção é
a melhor maneira de evitar males maiores. Qualquer obra pública – mesmo que
seja mudar três peças lajotas da calçada – é uma concentração de barreiras de
proteção e luzes de advertência coordenados por um exército de trabalhadores
usando capacete, óculos de segurança, uniformes e coletes reflexivos. Dois ou
mais deles são encarregados de sinalizar a obra para pedestres ou motoristas,
se for o caso, apesar da exibição de luzes coloridas, pois pode ser que ainda
não as tenham visto. 9 Filas silenciosas. Para um japonês, fazer fila faz parte da rotina
diária. E eles fazem isso de uma maneira ordenada, silenciosa e paciente, sem
que ninguém sequer pense em furar. O japonês é muito ligado a seguir as novas
tendências. Se uma sorveteria se tornou moda, ele não hesitará em passar uma
hora na fila ao ar livre para pegar seu precioso e possivelmente
superestimado sorvete. 10 Banheiros públicos, limpos e gratuitos. Em nenhum outro país do mundo os viajantes que me acompanham
viram tantos banheiros públicos e gratuitos. E, ainda por cima, limpos como uma
balsa. Mesmo no meio do mato, na estrada para Nakasendo rota histórica que
liga Edo/Tóquio a Quioto vimos um dia destes um solitário em uma área
despovoada e que, para surpresa de todos, ao abrir a porta tinha luz, papel
higiênico e um vaso tão limpo que você poderia se sentar nele. De marcianos. 11. Um cartaz para cada situação. Os japoneses não falam nenhuma outra língua
estrangeira. Mas há cartazes que explicam tudo. Uma oferta esmagadora de
decretos explicativos como se a população fosse composta de crianças de dois
anos de idade. De um mapa sobre a situação dos mictórios e vasos
sanitários em um banheiro de estrada até como usar um elevador. 12 Ruas sem nome. Não pergunte por que, mas nas ruas japonesas o nome
não é colocado em uma placa. Nem, pelo menos, no início e no final, como no
restante do mundo. Isso significa que, se você não for um carteiro, encontrar
um endereço será a tarefa dos super-heróis da Marvel. Graças a Deus,
existe o Google Maps. 13 Sexo sem penetração. A indústria do sexo é muito poderosa no
Japão. Isso deu origem ao fuuzoku annai-jo literalmente, lugares de
informação gratuita, escritórios que informam sobre o lazer adulto e noturno
em um bairro, do passeio mais singelo ao sexo pesado. Pode ser a contratação de
um host ou hostess companhia masculina ou feminina para
conversar, se vestir de acordo com suas fantasias ou sair para jantar
acompanhado/a, tudo muito naif e sem sexo ou toques ou o passeio de
um adulto com uma adolescente vestida de colegial. Também sexo em seus vários
graus legais no Japão sexo por dinheiro só é ilegal se houver penetração. 14 Tudo é reciclável.
Nas comunidades do bairro, a gestão de lixo é muito
rigorosa. O lixo orgânico é retirado todos os dias, mas
o reciclável só uma vez por semana, de acordo com as normas locais.
Por exemplo: terça-feira, papel; quarta-feira, plásticos e embalagens, etc. Se
você não cumprir, os seus vizinhos te chamam a atenção com muita raiva. 15. Religião pelo civil.
A sociedade japonesa é muito moderna, tecnológica e
consumista. Mas não hesitam em fazer fila de duas horas ordenadíssimas, claro –
no dia de um festival religioso em um templo específico só para cumprir a
tradição de jogar algumas moedas no santuário, bater palmas duas vezes e fazer
uma reverência diante do altar. 16 Bondade em abundância. Mas se algo impressiona um viajante novato no Japão
acima dessas 15 razões anteriores, é a gentileza do povo. Este é um ditado
clássico de muitos países, mas no Japão não é um tópico. É a pura realidade.
Peça informações, diga que não entende o cardápio em um restaurante ou entre em
um banco para perguntar se trocam dinheiro e eles vão te atender com um sorriso
e uma série de genuflexões que farão você se sentir o rei do mambo. Apesar de
você não ter entendido nada do que eles dizem, porque nem Deus fala inglês. NOTA: Todos esses comentários podem levar à
conclusão de que nos deparamos com a sociedade perfeita. Mas não é assim. A
primazia do público sobre o privado, a elevada auto exigência no trabalho, as
relações pessoais frias e rígidas também geram problemas sociais. Mas esse seria
outro debate. Entenda estes 16 pontos como percepções simples de um viajante
que descobre as curiosidades de um país estranho. Sem pretensões de filosofar
sobre a complexa sociedade japonesa. Autor: Paco Nadal. El País. Por Viana Visão